sexta-feira, 8 de abril de 2022
GOLPE OU REVOLUÇÃO?
Hoje completa 58 anos do Golpe Militar de 1964 e ainda se discute se foi golpe ou foi um “movimento”. Palavras... Na Ciência Política golpe é quando ocorre a derrubada pela força de um governante constitucional, ou seja, foi eleito por voto direto ou indireto de acordo com as regras estabelecidas na carta magna de um país. Golpe é um termo considerado pesado e os militares não gostavam e ainda não gostam e preferiam Revolução e hoje Movimento.
A bem da verdade o golpe foi o resultado de um complô entre políticos conservadores, empresários, parte da igreja católica e militares. Mas depois de assumirem o poder, os militares chegaram à conclusão que eles governariam melhor o país do que os civis e lá se foram vinte anos com o país sob o domínio dos coturnos. Era uma ditadura envergonhada que fazia eleições para “inglês ver”. Escolhiam os presidentes nos quartéis e depois mandavam os congressistas votarem neles. A diferença das outras ditaduras é que não havia continuísmo. A cada quatro anos escolhiam um novo general. Por outro lado, era uma ditadura igual as outras, pois censurava a imprensa, músicas, teatro, livros e cinema. Cassava o mandato dos políticos que discordavam, prendiam, torturavam e até matavam artistas, líderes sindicais, jornalistas, professores e intelectuais, que faziam oposição ao governo.
Lembro-me muito bem dos acontecimentos de 1964. O presidente João Goulart, assumiu o governo para substituir Jânio Quadros que renunciou. Na época o vice-presidente era eleito separadamente e não numa chapa como é hoje. No dia do Golpe, meu pai estava preocupado com os acontecimentos políticos e como era um menino curioso já me interessava por política, fiz a ele várias perguntas que não conseguiu me responder. Foi então que ele me pegou pelo braço e fomos conversar com um amigo político que morava num bairro próximo. Seu Manoel, um vereador que oscilava entre uma postura conservadora e progressista. Foi uma longa conversa que fiquei ouvindo calado, pois criança não podia entrar em conversa dos adultos. Ele também não sabia o que iria acontecer, mas tinha algumas pistas. Jango não voltaria mais para Brasília, pois ainda em solo brasileiro o cargo de presidente foi considerado vago, abrindo as portas para um general assumir o governo. Pensava-se que seria por pouco tempo, apenas o suficiente para tirar os “comunistas” do poder e em seguida seriam convocadas novas eleições. As eleições nunca vieram e a democracia brasileira viveu uma longa noite em trevas.
Antes do Golpe, ouvia várias conversas em casa, nos ônibus, no armazém ou na padaria e uma delas me lembro muito bem. Um senhor bem-falante dizia que se ocorresse uma revolução, " o Jango não ficaria no poder, pois era um latifundiário, não um socialista, mas um burguês. Ele seria o primeiro a espirrar, assumindo o comando do país um comitê revolucionário". Em geral o Jango era querido pelo povão como um todo, pois seu discurso populista, ia ao encontro das necessidades dos mais pobres. As chamadas Reformas de Base assustavam muita gente. Meus parentes fazendeiros do interior estavam preocupados, pois os lavradores já falavam em reforma agrária, em divisão dos latifúndios, coisa e tal.
O termo mais utilizado na época e durante muito tempo era a Revolução Redentora, que havia salvo o país do comunismo. Meu pai mesmo apoiando o Jango, não era comunista e tinha horror de ouvir falar nisso. Ele votou no Jango para vice-presidente, mas não no Jânio porque o detestava e o considerava falso e mentiroso. Ele tinha uma visão bem negativa do comunismo, pois nosso vizinho russo contava para ele as atrocidades dos comunas quando tomaram o poder sob o governo do Stalin. Ele e sua família conseguiram fugir caminhando durante dias até a fronteira passando fome e frio.
Após quase vinte anos os militares entregaram o poder aos civis, mas cuidadosamente, para evitar retaliações. Antes fizeram uma anistia ampla, geral e irrestrita, para que todos fossem perdoados. Com uma hiperinflação e uma dívida externa impagável, deixaram a batata quente com os civis e o Brasil entrou em moratória.
Hoje temos um presidente eleito pela maioria da população, que defende explicitamente a ditadura militar e as medidas de exceção, enquanto um governador em seu discurso para a renúncia do cargo para se candidatar a presidente, lembrou da ditadura militar que obrigou seu pai a se exilar na França com a familia, quando ele era um menino de 7 anos.
O NACIONALISMO E AS GUERRAS
O NACIONALISMO E AS GUERRAS
O nacionalismo é uma das mais nefastas ideologias, pois sob o pretexto de defender os interesses nacionais, foi ao longo da história o responsável por quase todas as guerras. Na maioria das vezes as guerras são incentivadas pelas burguesias industriais, comerciais ou financeiras, que induzem os governantes a atacarem países concorrentes de seus produtos ou para ampliar os mercados. Outras vezes o desejo de um governante se perpetuar no poder ou para se manter nele quando se sente fraco. Se lança às aventuras e como sempre acontece colocando o povo para morrer pela pátria e ou viver sem razão como diz uma velha canção.
A narrativa do Putin para invadir a Ucrânia se insere no segundo caso. Um governante querendo afirmar seu poder autoritário, alegando que o país vizinho fazia parte da Rússia e por isso não deve ser uma nação independente. Ele justifica a invasão alegando que está defendendo os interesses do povo russo. Do povo russo? Que cinismo. Que interesses teriam os russos em incorporar uma nação apenas por razões étnicas e históricas? Os povos criam as suas identidades a partir do isolamento por razões geográficas, políticas e culturais. A partir do momento em que se criou uma identidade como povo, não há possibilidade de retorno às condições anteriores. O próprio Lenin, líder da Revolução Russa de 1917, quando reconheceu essa identidade, criando a República da Ucrânia, com certeza não fez isso do nada. Havia razões históricas, políticas, culturais e sociais para essa decisão.
Marx, era um crítico do nacionalismo, pois o considerava um atraso político que atrapalhava o pleno desenvolvimento da consciência de classe. Via essa ideologia como válida apenas quando se tratava de uma luta para a autodeterminação dos povos. No entanto, quando essa autodeterminação só servia para atender aos interesses da burguesia, perdia todo o sentido, pois segundo ele, o povo continuaria sendo explorado pelo capital, agora nacional e não mais pelo colonizador ou nação dominante.
Zelensky, apesar de defender o território invadido de forma ilegal, sem um motivo justificável, também apela pelo nacionalismo do povo ucraniano, mas no caso existe um sentido libertário. Ceder ao governo russo seria abdicar do direito do povo ucraniano decidir o seu destino como nação e se submeter ao autoritarismo de Putin. Durante mais de 60 anos os ucranianos, como também todos os povos da antiga URSS, foram submetidos a governantes totalitários, começando com Lenin e depois o cruel Stalin durante 25 anos. Nunca houve democracia no socialismo soviético. As pessoas desapareciam ou eram deportadas para a Sibéria sob qualquer suspeita de questionamento sobre o regime. Os mais velhos devem se lembrar de uma época em que morria um general quase todos os dias. Era muita coincidência. Mesmo revolucionários de primeira hora foram perseguidos e presos com as mudanças de humor do ditador de plantão. E assim, quando chega a oportunidade de se libertarem do jugo autoritário, o nacionalismo russo é usado como pretexto para a Ucrânia se tornar novamente num protetorado russo.
Hitler quando resolveu invadir outros países alegando que na Checoslováquia e Polônia existiam cidadãos alemães, na realidade queria mesmo expandir o território germânico e ampliar o controle sobre o comércio em toda Europa. Solano Lopes no século XIX, queria expandir o território paraguaio até o Oceano Atlântico. Para isso, iniciou uma guerra absurda com o Brasil, Uruguai e Argentina que levou a população ao quase genocídio, restando velhos, mulheres e crianças. O General Galtieri, ditador argentino, nos anos 1980, tirou da gaveta uma velha reivindicação dos argentinos sobre as ilhas Malvinas, que estão sob o poder inglês há quase duzentos anos e decidiu invadir as ilhas. Levou uma surra que destruiu a vida de milhares de jovens apenas para mantê-lo mais tempo no poder medindo forças com uma grande potência militar. Derrotado, logo caiu, pois ninguém se sustenta no vácuo.
A história está repleta de exemplos de movimentos nacionalistas que resultaram no sofrimento das populações, com grandes hordas de refugiados, crianças órfãs, viúvas com filhos sem amparo, aleijados e economias arruinadas. Será que a pátria amada compensa tudo isso?
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